sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Lição 5 - A máquina

                                                                
TRANSCRIÇÃO pelo Professor ERICH GONZALEZ, na cidade de Maracaibo, Estado Zulia, Venezuela. LIÇÕES DO Dr RAFAEL BENSADON EM APONTAMENTOS TOMADOS PELO ALUNO ERNESTO CARRANZA.

LIÇÃO 5 - A MÁQUINA 
Prezados leitores. 
Minhas saudações e respeitos. Uma vez mais, continuemos com as lições do Dr. Besandon. Lições que faço chegar até vocês com o único propósito de ajudar a melhorar seu jogo, já que é um texto ameno e simples. As seguintes palavras escritas pelo aluno Ernesto Carranza, a quem gostaria de apertar sua mão pela magnífica obra junto ao excelente professor Rafael Bensadon, são significativas. 
O sistema didático do Dr. Bensadon se baseia em preceitos distintos dos praticados até agora na maioria dos livros publicados. Em lugar de sobrecarregar o aluno com uma série interminável de variantes para cada posição, das quais nada reterá, o professor Bensadon prefere ditar regras fáceis de recordar, oferecer conselhos práticos, assinalar teorias, reiterar conceitos.
Em outras palavras, dá a idéia fundamental, que serve não somente para a posição que está sendo analisada, mas para qualquer outra similar.Com tudo isso, o aluno forma sua bagagem de conhecimentos e sabe a que se ater quando se lhe coloquem casos análogos, sem necessidade de "acertar" de memória a jogada que deve executar, porque conhece o plano ao qual deve ajustar seu jogo. Dito com mais brevidade: sabe o que deve fazer.

LIÇÃO 5 - A MÁQUINA 
Vamos tratar de um tema aparentemente simples, que em nosso meio enxadrístico é conhecido por "MONTAR A MÁQUINA". Fazemos notar que PARA QUE A "MÁQUINA" SEJA EFICAZ, É NECESSÁRIO QUE O CONTRÁRIO NÃO SE DÊ CONTA DE QUE ESTAMOS POR MONTÁ-LA. Devemos, portanto, disfarçar nossa intenção com outras ameaças como veremos mais adiante. 
"A máquina" consiste em ameaçar mate direto com um bispo e a dama apontando em diagonal ao roque inimigo. Parece simples, porém quando haja desaparecido o cavalo de 'f6' (ou 'f3' das brancas) do contrário e se consegue "armar a máquina", muitas vezes resulta suficiente para ganhar em seguida, já que não só constitui uma ameaça de mate fulminante, senão que continua sendo uma "ameaça latente", que para ser destruída pode custar uma peça ao adversário. Ademais, seja ou não infantil, o adversário deve pará-la e resulta difícil se defender, pois quase sempre debilita seu roque o que dá lugar a outras possibilidades e até permite ganhar tempos para o ataque.
Como é fácil um jogador não ver a intenção de "montar a maquina" ou, ainda que veja, não lhe dê importância porque acredita que pode pará-la facilmente, resulta que em muitas partidas se pode fazer uso da máquina. E desde já diremos: EM POSIÇÕES ABERTAS "A MÁQUINA" É MUITO DIFÍCIL DE PARAR. 
A partida que veremos foi jogada no torneio de Folkestone e, nela, depois de uma série de jogadas estratégicas chegamos a uma posição ( movimento 22) em que o branco se propõe a "armar a máquina" e o consegue, pois apesar de o adversário pressentir, deve atender a outras ameaças. Uma vez que a montou, ganha-se a partida rapidamente com um correto sacrifício de torre, que para o aficionado constitui uma "jogada brilhante".


BRANCAS: OPOCENSKY
NEGRAS: MACKENZIE

1.d4 Cf6 
Já sabemos que a jogada efetuada pelo negro é uma das melhores contra as aberturas de peão dama devido a sua elasticidade, já que por enquanto não "mostram a cara", reservando-se o direito de jogar a defesa que mais lhe agrade.

2.c4 
Mostrando a cara.

2...e6 3.Cc3 Bb4 
O lance das negras é o início da chamada "DEFESA NIMZOVITSCH", criada pelo mestre do mesmo nome, um revolucionário do xadrez, de conceitos um tanto extravagantes, porém baseados em sólidas razões estratégicas. Esta defesa consiste em não deixar o branco jogar um "vulgar" gambito de dama e, já sabemos que É UM BOM PLANO TÁTICO NÃO JOGAR DE ACORDO COM O GOSTO DO ADVERSÁRIO
Entretanto, a Defesa Nimxovitsch não é aconselhável para os aficionados. Para um bom jogador sim, porque saberá desembaraçar-se dos problemas que surgirem. Porém, para o iniciante, a abertura é de grande importância, pois caso se encontre em posição inferior e não saiba como sair dela perderá irremediavelmente. 
A principal razão pela qual não aconselho a Defesa Nimzovitsch é a seguinte: mais adiante o branco jogará 'a3' e ao bispo restará dois caminhos: tomar o cavalo ou se retirar. Analisemos todas as possibilidades. Se mata o cavalo, "não é negócio" porque sabemos que é mais conveniente conservar o par de bispos. Caso se retire a 'a5', o branco segue 'b4'e o bispo morre sem pena e sem glória, já que em 'b6'seria alcançado com 'c5'. E, por último, se se retira por sua diagonal, deve ir a 'e7', com o que teremos perdido miseravelmente um tempo e deixamos a iniciativa nas mãos do adversário.

4.Dc2 0-0? 
Agora o branco aproveita e leva outro peão ao centro, dominando a casa 'd5'. (Segundo as análises que realizou o grande campeão mundial José Raul Capablanca, para as negras é melhor 4...d5, disputando o centro.)

5.e4 Bxc3+ 
Obrigando a retomar o bispo com o peão de 'b2'. Se 6.Dxc3 segue Cxe4.

6.bxc3 
As negras pensam que dobrando os peões inimigos compensam a diferença do bispo pelo cavalo. Desta maneira se desfazem de seu bispo e não perdem um tempo. Não está mal o raciocínio, ainda que logo veremos que não resultou eficaz.

6...h6 
Dando escape a seu cavalo, em caso de 'e5'.

7.Bd3 d6 
Aqui vemos como é boa a elasticidade de 1...Cf6 em vez de 1...d5. Agora, deve-se jogar o peão da dama à casa 'd6' por várias razões: Para disputar o centro e para tornar "bom" o "bispo mau". Esclareçamos: ENTENDE-SE POR BISPO MAU AQUELE QUE NÃO TEM MOBILIDADE devido à colocação dos próprios peões, colocados em casa da mesma cor do bispo. Porém este qualificativo só vale quando os peões já estão "fixos" e não quando o bispo está por trás de peões "móveis" (como seria o presente caso). Agora, colocando os peões em casas de cor distinta a de seu único bispo, o negro trata de tornar "bom" seu "bispo mau".

8.f4! 
Levando outro peão ao centro e obtendo enorme vantagem em espaço.

8...e5 
Era necessário para não "morrer afogado". Aparentemente, perde-se um peão, porém logo se compensa e até se recupera.

9.Cf3 
Se 9.fxe5 dxe5 10.dxe5 10...Cg4 ameaçando o peão dobrado; se o branco defende com: 11.Cf3 Te8 e AOS POUCOS, OS PEÕES DOBRADOS CAEM COMO FRUTA MADURA (ou, se acharem melhor, como dentes de velhas).

9...Cbd7 10.c5 
Vimos que ambos os jogadores puderam trocar os peões centrais e não o fizeram; isso significa que nenhum deles está disposto a tomá-los. Daí porque o branco o "apure".

10...De7 
Se 10...dxc5 11.fxe5 com grande domínio do centro.

11.cxd6 
Desdobrando-se.

11...cxd6 
Recordemos o que dissemos no lance 5... Bxc3+. O branco conseguiu se desembaraçar de seu peão dobrado, resultando um "mau negócio" trocar o bispo pelo cavalo. Acrescente-se que o peão negro de 'd6' é um ponto fraco, mantido unicamente por uma peça maior.

12.0-0 exf4 13.Bxf4 Cb6 
Para dar jogo a seu bispo. Se fizermos um balanço, veremos que existem vantagens claras para o branco em espaço, tempo e iniciativa.

14.Tae1 Be6 
Para fechar um pouco a coluna do rei.

15.e5 
Para abrir.

15...dxe5 
A melhor.

16.Cxe5 
Haveria sido igualmente bom tomar o peão com o bispo ou com a torre. QUANDO A POSIÇÃO É SUPERIOR, QUASE TODAS AS JOGADAS SÃO BOAS. Façamos outra observação: o negro tinha um peão fraco em 'd6', do qual se desembaraçou porque as brancas facilitaram isso. E o que o branco obteve em compensação? Tem o peão da dama "passado" (nenhum peão negro pode se opor à marcha deste peão até a oitava fila) e pode se transformar em dama com facilidade.

16...Tac8 17.c4 
Este é um lance ou, se quisermos, uma cilada. O peão de 'c4' está agora atacado por três peças e defendido por três (uma das quais é a dama), porém não se pode tomar o peão.

17...Db4 
Porque se 17...Cxc4 18.Bxc4 Bxc4 19.Cxc4 e a torre atua sobre a dama, que deverá se mover, e o melhor será a 'b4'; então 19...Db4 20.Bd6 e se 20...Dxd6 21.Cxd6 Txc2 etc.

18.Tb1 
Jogada ativa.

18...De7 
Regressa.

19.De2 Tcd8 
Ataca o peão de 'd4'.

20.Df2 
O branco reserva o avanço do peão a 'd5'. Provavelmente não seria interessante porque as negras poderiam sacrificar uma peça por dois peões centrais, entrando em uma série de possíveis combinações.

20...Cg4 21.Cxg4 Bxg4 22.d5 
Agora avança.

22...Bc8 
O negro viu que seu peão de 'b7' está defendido somente pela dama, o que a imobiliza na segunda linha, se mais adiante deseje jogar seu cavalo, ou se este fosse desalojado com um possível avanço do peão a 'c5'. Assim se explica 22...Bc8. E já chegamos ao momento preciso que desejávamos para esta lição. Ao avançar seu peão a 'd5', o branco anteviu a idéia que lhe dará a vitória. E, diante do movimento inofensivo do negro, decide "montar a máquina". Observemos que o cavalo negro de "f6' desapareceu e que a posição é aberta, o que indica que a maquina será eficaz. Como se poderia fazer para montá-la? Os lances "saem por si". Trata-se de por a dama em 'd4' e o bispo atrás, em 'c3' ou 'b2', tomando a grande diagonal e apontando ao roque inimigo. Também é necessário realizar tudo NO MENOR NÚMERO POSSÍVEL DE JOGADAS E DISSIMULANDO O PROPÓSITO. As brancas começam por buscar o caminho para seu bispo dama.

23.Bd2 
Para colocá-lo em 'c3'.

23...Da3 
As negras vislumbraram a combinação e tratam de impedi-la. Com 23... Da3 evitam que o bispo se situe em 'c3', ao mesmo tempo que ameaçam o outro bispo e o peão de 'a2'. A idéia é boa, porém QUANDO SE DOMINA MUITO ESPAÇO, SEMPRE HÁ JOGADAS BOAS PARA SE OPOR AO RIVAL, e é por isso que as brancas darão uma forte réplica, enquanto continuam com seu plano. QUANDO OS DOIS BISPOS E A DAMA APONTAM PARA O ROQUE CONTRÁRIO QUE JÁ NÃO TEM O CAVALO EM 'F6', DIFICILMENTE O ADVERSÁRIO PODERÁ SE MANTER. Alem disso, uma vez que a dama branca vá a 'd4', ameaça-se ganhar a qualidade com Bb4 e existe a possibilidade de armar duas máquinas.

24.Dd4 Tfe8 
As negras devem se opor à montagem das maquinas. Para isso, levam sua torre de 'f8' a 'e8' para tomar a coluna 'e', impedindo uma das máquinas e com a idéia de por sua dama em 'f8', defendendo o peão de 'g7', sobre o qual vai se desencadear a tormenta.

25.Bb4 
Com isso se impede que a dama possa defender o peão de 'g7'. As brancas poderiam jogar diretamente Bc3 montando a máquina. Se 25.Bc3 Df8 então 26.Bb4 ganhando a qualidade, porém sem dar mate. O lance de Opocensky é mais eficaz.

25...Da4 
Tomar o peão de 'a2' não faria diferença.

26.Bc3 
Montou a máquina.

26...f6 
Única para se salvar do mate, porém debilitando fortemente o roque, o que dá motivo a que o branco execute uma "jogada brilhante", que só não é tal porque existe na posição uma ameaça latente contra o roque negro e a torre branca domina a coluna 'f' aberta.

27.Txf6 Cxd5 
Não era possível 27...gxf6 porque o mate seria inevitável depois de 28.Dxf6 Td7 (o 28...Dd7 29.Dh8+ Rf7 30.Dg7#) A) 29.Dg6+ Rf8 (29...Tg7 30.Dxg7#) 30.Tf1+ Re7 (30...Tf7 31.Dxf7#) 31.Df6#; B) 29.Dh8+ 29...Rf7 30.Dg7# As negras então não tomam a torre e tentam outra réplica para se salvar da comprometida situação.

28.Tf8+ 
Entrega a torre outra vez!. E as negras abandonam. 
A jogada é decisiva. O rei não pode "escapar". O mate é inevitável com outro "brillantismo" que não é tal, senão uma jogada correta que define a partida. 

CONCLUSÃO: 
"A máquina" é um bom recurso tático quando se sabe usar e pode dar lugar a partidas "brilhantes". Porém, não nos entusiasmemos muito, porque é uma coisa muito simples e porque A MÁQUINA SÓ É RECOMENDÁVEL QUANDO O CAVALO DE 'F5' TIVER DESAPARECIDO E EM POSIÇÕES ABERTAS. Em tais casos, ganha-se de forma fulminante. Bom, amigos leitores, finalizamos a quinta lição, esperando que tenham gostado. Na próxima, tratarei de outro tema interessante. Até breve. 
Profesor: Erich Gonzalez 
e - mail: edgonzal@luz.ve.
(Tradução: Elias Muniz)

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